segunda-feira, dezembro 11, 2006

MEGALupa: Clubes descobriram o cliente que há no sócio

Muda-se de família, de carro, de política e de religião, mas não de clube. Foi com base neste lema que os principais emblemas desportivos descobriram uma nova fonte de rendimento em época de crise. O fenómeno das marcas desportivas é específico e sempre existiu, mas foi a partir da criação das sociedades anónimas desportivas (1996) que Benfica, FC Porto e Sporting se interessaram mais pela área dos associados.
A viragem do milénio foi também o momento em que "passou-se do orgulho em ser sócio para a vantagem de ser associado do clube com que simpatizamos. O sócio a sério é hoje menos representativo", garante Silva Gomes, ex-director-geral da agência de publicidade McCann Erickson.
Desde 1996 as mudanças são gigantescas, desde a forma laboral até ao conteúdo. "Agora é tudo informatizado e mais fácil, mas foi necessário cativar o sócio para virar cliente e depois, numa terceira fase, fidelizá-lo." O publicitário que tentou implementar essa ideia na Luz, na altura da presidência de Manuel Damásio, reconhece hoje que nem todos viam o sócio como uma fonte de rendimento potencial.
Silva Gomes, então vice-presidente da área comercial e marketing do Benfica, foi o responsável pela campanha "Operação Coração", uma espécie de empréstimo obrigacionista em que os sócios compravam títulos do clube (a 5 euros cada), permitindo um encaixe financeiro de cerca de 650 mil euros, que permitiu amortizar dívidas.
Com o nascimento das SAD todo o futebol foi comercializado - e o simpatizante não fugiu à regra. Paralelamente aos contratos milionários dos jogadores, menosprezou-se de alguma forma os valores de quem vibra com as cores de eleição. Mas quando a crise chegou, os clubes socorreram-se dos parceiros estratégicos, empresas que se associam aos emblemas desportivos para chamar clientes. E todos ganham com isso. O marketing desportivo tornou-se assim no playmaker dos clubes e quanto mais forte for a imagem da marca, maior será o poder negocial - nos contratos publicitários, por exemplo.
"Ao poucos educou-se o adepto de que ser sócio tinha vantagens para além da ligação efectiva e do desconto no preço dos bilhetes", explica Silva Gomes, para quem a evolução do sócio simpatizante para o associado cliente ainda vive muito à custa do momento da equipa de futebol.
Tal como confirma Henrique Paes, do FC Porto: "Quando vencemos a Liga dos Campeões e a Taça Intercontinental chegámos aos 140 mil associados. Hoje temos 105 mil pagantes." O director de marketing do dragão vê o FC Porto como "uma marca regional com expressão europeia e mundial". Afinal, o emblema azul e branco está no G14, o núcleo dos clubes mais poderosos a nível mundial. "A nós não nos interessa ter parceiros regionais e desvirtuar o mercado. O nosso conceito é diferenciador, não queremos angariar sócios à la carte. Queremos e apostamos na fidelização."
Já o Sporting é dos três "grandes" aquele que tem menos sócios, mas Pedro Afra acredita que são fiéis. "Temos tido algumas falhas nessa área, mas estivemos 18 anos sem ganhar nada e quando vencemos o título a marca estava bem viva." Para o director do Sporting Comércio e Serviços, "é a fidelização que enaltece e valoriza a marca, não o facto de ter mais ou menos associados. Temos adeptos fiéis que passam a sócios fiéis". Porém, discorda "plenamente" daqueles que dizem que se está a mercantilizar os sócios. "Tentamos levar aos adeptos um pouco do clube todos os dias, em benefício do Sporting e do simpatizante, seja de Caminha ou Lisboa."
Para os associados do Benfica não há satisfação maior do que figurar no Guinness como um dos 161 141 sócios da família benfiquista. Miguel Bento, director de marketing do clube, explica que o recorde foi planeado: "E a curto prazo queremos chegar aos 200 mil e no fim do mandato aos 300 mil, um número que não é impossível se cada trouxer um novo sócio."
O Kit Sócio do Benfica surgiu depois de um estudo de mercado com a seguinte pergunta: que razões para ser sócio do Benfica? "E percebemos que além da carga emocional havia quem admitisse ser sócio desde que também ganhasse com isso, independentemente de não gostar de ver futebol", explicou.
O valor do cliente do "negócio futebol" envolve hoje todo o universo à volta das cores do emblema de eleição. Mas, tal como os maus jogadores ou os maus dirigentes, também os maus sócios são punidos. Na Luz demitem-se sócios de dois em dois anos, enquanto no FC Porto e no Sporting as listas são revistas a cada quatro anos.

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